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Este artigo de revisão escrito por estudiosos franceses aborda a importância da farmacogenética em oncologia, um campo que examina como as variações genéticas herdadas de um paciente influenciam sua resposta aos medicamentos, tanto em termos de eficácia quanto de toxicidade (acesse a íntegra do artigo aqui. O objetivo principal é desvendar o potencial da farmacogenética no cuidado do câncer, desde o tratamento oncológico em si até os cuidados de suporte, fornecendo uma visão geral das recomendações farmacogenéticas de sociedades científicas e profissionais, e discutindo os desafios e perspectivas para sua integração na prática clínica para uma gestão mais personalizada de pacientes com câncer. O artigo destaca que a variabilidade individual na resposta a medicamentos é influenciada por fatores genéticos, como polimorfismos, que podem afetar o metabolismo de drogas ou aumentar a suscetibilidade a efeitos adversos.

Metodologia

O artigo é uma revisão da literatura, compilando e analisando dados e recomendações existentes de diversas sociedades científicas e consórcios internacionais (como RNPGx, CPIC, DWPG, ESMO). Ele descreve os principais farmacogenes que impactam o tratamento do câncer e os cuidados de suporte, para os quais foram emitidas recomendações nacionais e internacionais. A metodologia se baseia na síntese de evidências sobre a relação entre genótipos específicos e a resposta a medicamentos, incluindo a eficácia, toxicidade e as implicações para o ajuste de dose.

Principais Achados e Resultados Significativos

  1. Farmacogenética de Agentes Anticâncer:
    • Irinotecano: A toxicidade (neutropenia e diarreia) está fortemente associada ao polimorfismo UGT1A1*28, com indivíduos homozigotos (*28/*28) necessitando de doses significativamente menores. Recomendações do RNPGx orientam o genotipagem pré-tratamento para antecipar e reduzir toxicidades severas.
    • Fluoropirimidinas (5-FU, capecitabina): A deficiência enzimática de di-hidropirimidina desidrogenase (DPD), codificada pelo gene DPYD, pode levar a toxicidades graves e fatais. Polimorfismos como DPYD*2A, D949V e *13 são significantemente associados a um risco aumentado de toxicidade. Recomendações de consórcios como CPIC sugerem ajustes de dose baseados na pontuação de atividade de DPD. O artigo ressalta que a genotipagem direcionada tem baixa sensibilidade e que a combinação de genotipagem e fenotipagem (medida de uracila) é crucial para uma triagem abrangente.
    • Tiopurinas (6-Mercaptopurina): Polimorfismos nos genes TPMT e NUDT15 são os principais fatores que influenciam a toxicidade (mielotoxicidade, hepatotoxicidade) e a eficácia. As recomendações do CPIC preveem reduções de dose para pacientes com variantes patogênicas nesses genes.
    • Tamoxifeno: O metabolismo do tamoxifeno para seu metabólito ativo endoxifeno depende do CYP2D6. Pacientes com baixa atividade do CYP2D6 têm risco aumentado de recorrência do câncer de mama. Embora o genotipagem do CYP2D6 para tamoxifeno seja controverso (com algumas entidades, como ESMO, não recomendando o rastreamento de rotina), o CPIC emitiu recomendações de alto nível.
    • Terapias Alvo (Inibidores da Tirosina Quinase – TKIs): A variabilidade na exposição a TKIs pode ser explicada por polimorfismos que modulam o metabolismo, como CYP3A4*22. No entanto, o impacto clínico direto desses polimorfismos na eficácia dos TKIs ainda é limitado e requer mais estudos.
    • Sacituzumabe Govitecano: Este conjugado anticorpo-droga libera SN38 (metabólito tóxico do irinotecano), e pacientes com o alelo UGT1A1*28 são mais propensos a descontinuar o tratamento devido a toxicidades significativas.
  2. Farmacogenética em Cuidados de Suporte:
    • Analgésicos Opioides (codeína, tramadol): O metabolismo desses medicamentos pelo CYP2D6 é crucial. Metabolizadores ultrarrápidos de CYP2D6 convertem codeína em morfina muito rapidamente, aumentando o risco de toxicidade, enquanto metabolizadores lentos podem ter analgesia diminuída. Recomendações preveem contraindicações ou ajustes de dose.
    • Antidepressivos Tricíclicos (amitriptilina): Polimorfismos nos genes CYP2D6 e CYP2C19 influenciam seu metabolismo. Para doses analgésicas, as recomendações de ajuste são menos claras, mas o monitoramento próximo é sugerido para metabolizadores lentos ou ultrarrápidos combinados.
    • Antieméticos (setrons): Polimorfismos do CYP2D6 podem afetar a eficácia de medicamentos como ondansetrona e tropisetrona, com metabolizadores ultrarrápidos apresentando menor eficácia antiemética.
    • Inibidores da Bomba de Prótons (IBPs): O CYP2C19 é uma via metabólica principal para IBPs de primeira geração. Metabolizadores intermediários e lentos do CYP2C19 podem ter maior exposição à droga e risco de efeitos adversos, enquanto metabolizadores ultrarrápidos podem necessitar de doses mais altas para eficácia.
    • AINEs: Polimorfismos do gene CYP2C9 (como CYP2C9*2, CYP2C9*3) afetam o metabolismo e clearance de AINEs como o ibuprofeno, influenciando a segurança e o risco de efeitos adversos gastrointestinais, renais e cardiovasculares.
    • Antibióticos (voriconazol, aminoglicosídeos): O voriconazol é metabolizado principalmente pelo CYP2C19, com polimorfismos afetando sua concentração sanguínea e risco de toxicidade/falha terapêutica. A ototoxicidade induzida por aminoglicosídeos está ligada a variantes no gene MT-RNR1.
    • Agentes Anestésicos (agentes halogenados, succinilcolina): Polimorfismos nos genes RYR1 ou CACNA1S podem predispor à hipertermia maligna, uma complicação rara mas fatal, contraindicando o uso desses agentes.
  3. Prática Atual e Desafios:
    • A maioria dos testes farmacogenéticos não é reembolsada pelos sistemas de saúde, representando um obstáculo significativo à sua implementação.
    • A integração da farmacogenética na prática clínica ainda é limitada, inclusive na França, devido à falta de conhecimento dos profissionais e diretrizes oficiais mandatórias.
    • Apesar das recomendações existentes, a prescrição não é sistemática.
  4. Perspectivas Futuras:
    • “Passaporte farmacogenético”: O estudo PREPARE demonstrou uma redução de 30% nos efeitos adversos com a genotipagem preventiva de 12 farmacogenes, apoiando a ideia de um “passaporte farmacogenético” para a gestão de pacientes polimedicados em oncologia.
    • Rastreamento tumoral: O rastreamento de DNA tumoral pode servir como uma ferramenta pré-triagem eficaz para identificar variantes farmacogenéticas de interesse, embora não substitua testes constitucionais definitivos devido ao risco de falsos positivos.
    • Integração no desenvolvimento de drogas: Há uma necessidade de mais estudos farmacogenéticos bem delineados e farmacoeconômicos para justificar o investimento e a integração da farmacogenética no desenvolvimento de novas terapias e na prática clínica.

Conclusões e Implicações

O artigo conclui que, embora as terapias-alvo tenham enfatizado a farmacogenômica somática, a farmacogenética constitucional oferece informações valiosos para otimizar a dosagem da quimioterapia e reduzir a toxicidade. Apesar de seu potencial significativo para a personalização do tratamento do câncer, sua integração clínica é limitada por uma baixa conscientização e desafios de reembolso. O cuidado oncológico pode se beneficiar da combinação da farmacogenômica (para seleção de tratamento guiado por tumor) com a farmacogenética (para mitigar efeitos adversos), o que requer estratégias mais claras para sua implementação rotineira e o treinamento contínuo de profissionais de saúde. A adoção de um “passaporte farmacogenético” e a exploração do rastreamento tumoral são vias promissoras para avançar na medicina de precisão em oncologia.

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